(...) Se alguém quiser dizer algo enquanto intelectual contemporâneo, tem de sentir os excedentes ilusórios da sua própria época e o seu terror. Falamos, de certo modo, instados por uma ordem linguística procedente da surpresa e do horror ou, de forma mais geral, com os potenciais extáticos da nossa própria época. Não temos outros imperativos. Como escritores da nossa época, não estamos investidos de um cargo pela graça de um rei ou de um deus. Não somos os mensageiros do absoluto, mas indivíduos com ouvido para as detonações do nosso tempo. Com esse imperativo, o escritor entra hoje em cena diante do seu público, tendo apenas como regra geral o recurso à sua «própria experiência». Esta também pode ser um poderoso emissor, caso tenha testemunhado o monstruoso. É ela que possibilita o nosso tipo de mediunidade. Se estou convencido de uma coisa, é de que, depois do Iluminismo, se não o contornámos, já não é possível a existência de media directamente religiosos, mas sim de consonância histórica ou de urgência.
Peter Sloterdijk, O Sol e a Morte, trad. Carlos Correia Monteiro de Oliveira