Não estou a dizer que seja custoso, mas é um funambulismo periclitante isto de sermos jovens velhos por dentro e andarmos constantemente a contornar os próprios fantasmas. Vejamos: durante muito tempo soube, e escrevi, que o meu mister seria o de fazer bater certo a minha raiva e quando o sublinhava pensava nas vinhas ao sol, rostos milenares cruelmente tracejados, mãos com pele vegetal que à mínima arranhadela cedem essa ternura rubra que vai pingando entre a árida terra, as queimadas, os pés das oliveiras por desbastar.
Depois, o aprender a rir-nos de nós próprios: é quando despimos a repulsa para vermos um pouco melhor. A seguir, e mais afoitos, almejamos ver a luz das pequenas coisas: um ombro, uma planta sustida na sua secura na jarra comprada por outrem, uma piada ao telefone do amigo que endoidece bem longe daqui. Enquanto isso trabalhamos administrativamente com rumo a uma suportabilidade do dia, nunca garantida, sempre perene. E agora que nos vêm bater à porta deste castelo arrendado e tão desfeito onde alojamos o nosso bom senso, pacientemente ouvimos os que trazem conselhos, algumas observações com vista ao corte, algum escárnio, naturalmente, e lembramos-nos: esquecemos de soltar os crocodilos no rio!
Isto para dizer, talvez, que estamos desde já conscientes do que a maioria ignora: o texto prometido não virá fazer tremer o mundo. É com o que nos é permitido conceber que teremos que nos amanhar. E, no entanto, amarrados por todos os lados, lemos uma pista que parece ascender da campa directamente para o caroço da nossa preocupação. Está em inglês e medita sobre o tempo que demora a ordenar as ruínas e acenamos ao morto por adivinharmos que também ele passou por aqui: esta estagnação feita de verbos que anseiam por um motivo vibrante.