ouvir os nomes passados alguns anos e algum treino e alguma rispidez

o teu  nome novo, comecei eu a tirá-lo com uma navalha da madeira grossa,
e nunca mais saía a única letra até dentro,
a primeira, e já toda a mão me sangrava
com o talho à volta dos dedos,
e a letra e o melhor do meu sangue e a seiva
metiam-se pela ferida como se ela mesma fosse
o meu trabalho apenas,
sangue que escorria pulso abaixo e me escoava:
a própria lavra da escrita -
¿oh quando arranjarei mão que alcance em sangue e força
o fundo final desse começo de ti,
nome terreno,
isso: coisa amada tanto quanto o alvoroço mortal deste fim de idade:
será que nenhum poder me devasta ainda?

Herberto Helder, A Morte Sem Mestre